Irmãos e irmãs,
Para os cristão do oriente praticamente hoje inicia o Natal.
É impressionante perceber como no cristianismo oriental a encarnação do filho de Deus prepara nove meses de caminhada de uma Igreja que sabe que o seu Deus se encarnou, quer dizer, se fez carne, se fez história.
Permita-me utilizar na meditação desta manhã a Primeira Leitura de hoje – que intrinsecamente se encontra com o cântico do Salmo: “Eis que estou aqui para fazer a Tua vontade, Senhor”.
Poucas vezes ouvimos as profecias que relatam ou fazem uma narrativa do reinado de Acaz. Dos poucos reis em Israel que teve consciência de fazer com que o povo descobrisse a presença de um Deus real, de um Deus que se fez história. Para muitas correntes, Deus sempre está nos céus. Deus era um tanto distante das dores e dos sofrimentos do seu povo, mas com essa profecia surge a voz de alguém que diz: “não ousais pedir sinais para Deus, pois o maior dos sinais é que uma virgem conceberá, dará a luz a um filho, seu nome será Emanuel, que significa Deus conosco.”
Deus conosco. Não é um Deus abstrato, não é um Deus da teologia católica. É um Deus conosco.
E para estar conosco Ele vai adquirir a nossa forma, Ele vai sustentar a nossa humanidade e Ele vai se tornar pessoa.
Aqui estão os três grandes atentados contra a vida humana:
Primeiro, negar a grandeza e a beleza da corporeidade. Nós não temos um corpo, nós somos um corpo e ser um corpo é sinal visível de encarnação.
O corpo se encarna, o corpo todo forma a carne e é graças a esse corpo que existimos, nos movemos e somos.
A filosofia existencialista e as correntes hedonistas do século XXI colocaram o corpo no último lugar da existência.
A segunda gravidade contra a vida humana é talvez a mais dolorosa: Os homens e mulheres nos fingimos de deuses, estamos temporalizando a vida.
Somos nós quem estamos decidindo a ontologia, a decisão definitiva do ser ou do não ser. E então alguém pode perfeitamente dizer: a partir desse momento eu não quero mais, desapareça da minha frente. A partir desse momento eu decido que não estou grávida, tu nunca exististe. A partir desse momento eu decido que vou acabar com a minha vida ou que não aceito a dor.
Permita-me trazer a frase de uma grande mulher que não acreditava em Deus, prêmio nobel de medicina (que por mais de 25 anos venho estudando a sua obra): Rita Montalcini. Essa mulher é fantástica, ela se diz totalmente incrédula, mas fez uma obra chamada “O elogio à imperfeição”:
“Se a imperfeição existe, existe, mas há uma molécula chamada vida humana que nem mesmo o mais puro dos seres têm direito a destruir”.
E a vida humana hoje entra em um questionamento constante, sedados e não sedados, mortes agilizadas ou mortes sustentadas. Aqui está o número um dessa solenidade: se Deus escolheu um corpo para nascer, porque os seres humanos negamos a corporeidade, a possibilidade da vida?
E o terceiro grau de atentado contra a vida humana: fechar o nosso coração para os outros. Penso que aqui está o sentido da Campanha da Fraternidade 2023.
Dai-lhes vós mesmo de comer. É um desafio da nossa cômoda situação, eu não faço nada para ninguém, eu sou bom.
Dai-lhes vós mesmos de comer. Sair um pouco da nossa zona de conforto, não é necessário alimentar 600.000 pessoas, mas é necessário olhar para o teu irmão que passa fome.
Dai-lhes vós mesmo de comer. Eu posso garantir, tutelar e defender a vida dos meus irmãos.
Foi assim que a profecia se instaurou: não ousamos pedir sinais a Deus, pois eis que Ele vos enviará o maior dos sinais: Emanuel, Deus conosco.
Padre Rafael Solano
cura da Catedral Metropolitana de Londrina
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LITURGIA 25.03.2023
Anunciação do Senhor
Primeira Leitura: Isaías 7,10-14; 8,10
Salmo Responsorial: 39(40)
Evangelho: Lucas 1,26-38c